Mais do que números, a Anistia Internacional Brasil buscou conhecer algumas das mais de 600 mil histórias interrompidas pela pandemia no BrasilEntre o Amazonas, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, trazemos as histórias de Dona ItaliraAruká Juma,  e Dejair e também sobre o colapso de Manaus, contados pelos seus familiares que sobreviveram à contaminação e ao descaso público.  

Nenhuma dessas pessoas se conheceram, mas todas elas foram atravessadas pela mesma negligência por parte das autoridades públicas na gestão da Covid-19. Enquanto hospitais públicos no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul estavam sobrecarregados, o Amazonas vivia a realidade de enterros coletivos, escassez de oxigênio, e o chamado “tratamento precoce”, comprovadamente ineficaz, era prescrito para pacientes em Manaus e comunidades indígenas na região.  

A falta de recursos e a precarização da saúde pública provocaram a violação do direito à vida, e para Madeí Juma, Paulo Roberto, Fabiana e Paola, custaram a vida de seus pais, mãe e sogro. 

De acordo com o Estudo “Mortes Evitáveis por Covid-19 no Brasil”, do grupo Alerta apenas no 1º ano da pandemia 120 mil vidas poderiam ter sido salvas se medidas não farmacológicas de controle da pandemia tivessem sido efetivamente adotadas pelo Brasil. O estudo, presentado na CPI da Covid-19 por Jurema Werneck, diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil, também apontou que mais de 20 mil pessoas morreram aguardando hospitalização e que o impacto da pandemia foi desproporcionalmente perverso para as populações negra, indígena e de baixa renda.   

A crise sanitária da Covid-19 no Brasil é uma crise de direitos humanos! E as incontáveis violações de direitos durante a pandemia precisam ser responsabilizadas. 

Conheça essas histórias:

“Oxigênio virou ouro”:  o colapso no Amazonas 

A crise de oxigênio no Amazonas foi um dos momentos mais chocantes da pandemia no Brasil. Enquanto literalmente faltava ar para a população e o governo insistia em tratamentos ineficazes, foi necessário que a sociedade civil se mobilizasse para salvar vidas. Por meio do movimento SOS Amazonas, Fabiana conseguiu arrecadar recursos para a compra de respiradores e cilindros de oxigênio.  

Mesmo ajudando a salvar tantas vidas, Fabiana não conseguiu salvar o sogro. Após sofrer um acidente de carro, ele precisou ser internado, contraindo COVID-19 no hospital e falecendo pouco tempo depois diante do colapso dos sistemas de saúde de Manaus.  

Não bastasse a dor do luto, a família de Fabiana – assim como diversas outras – a não conseguiu sepultar seu ente querido. O impacto causado pela pandemia no Amazonas foi tamanho que gerou uma sobrecarga nos cemitérios e funerárias do Estado. 

 

A falta das vacinas levou uma mãe no RS 

Dona Italira  tinha 81 anos quando foi internada em fevereiro de 2021. O que era somente uma cirurgia eletiva, virou um caso de contaminação grave por Covid-19. No colapso da saúde pública do Rio Grande do Sul e em meio aos atrasos na compra de vacinas e na efetivação do Plano Nacional de Imunização, Dona Italira,  que, àquela época ainda não havia sido vacinada – morreu em decorrência da Ccovid-19.   

No dia 3 de março de 2021, um dia após o falecimento de Dona Italira, o Ministério da Saúde publicou no Diário Oficial portarias mencionando dispensa de licitação na aquisição de 38 milhões de vacinas da empresa Janssen (ramo farmacêutico do grupo Johnson & Johnson) e 100 milhões de doses da vacina da Pfizer. 

 

Na linha de frente, mas sem proteção 

Seu Dejair, mais conhecido como “baixinho”, tinha uma simpatia e bom humor contagiantes. Ele era querido pela equipe de profissionais e pelos pacientes do Instituto Nacional do Câncer (INCA), onde trabalhava há mais de 20 anos como auxiliar de serviços gerais. 

Dejair foi um dos primeiros casos de infecção por Covid-19 na cidade no Rio de Janeiro. Seu filho, Beto, conta que após o informativo do Ministério da Saúde de que idosos faziam parte do grupo de risco para o coronavírus, o pai foi afastado do trabalho. No entanto, poucas semanas depois, a empresa o convocou de volta. Ele retornou e foi infectado.  

Ao buscar atendimento médico, o pai de Beto recebeu tratamento para gripe ao invés de coronavírus, o que não melhorou seu quadro. Seu Dejair faleceu de Covid-19 ainda em março de 2020, aos 64 anos.  

Indígenas e o “tratamento precoce” 

Aruká Juma era o último ancião de sua etnia. O indígena sobreviveu a massacres, lutou pela defesa de seu território contra os seringueiros e comerciantes de castanha, na década de 60, mas não sobreviveu à Covid-19, falecendo em fevereiro de 2021. 

Madeí, sua filha, conta que os indígenas que apresentavam sintomas da Covid-19 na sua aldeia, procuravam a Casa de Saúde Indígena (Casai) do município de Humaitá, sul do Amazonas, e eram tratados com medicamentos do suposto “tratamento precoce”. Segundo dados do Ministério da Saúde, foram distribuídas mais de 100,5 mil unidades de hidroxicloroquina, em comunidades indígenas, especificamente para o combate da pandemia. 

 

O que é a “Omissão Não é Política Pública”? 

A Campanha “Omissão Não é Política Pública” é uma iniciativa da Anistia Internacional Brasil em conjunto organizações da sociedade civil, entre elas: Oxfam Brasil, INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos, IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, Criola, Abrasco – Associação Brasileira de Saúde Pública, CIMI – Conselho Indigenista Missionário, Terra de Direitos, COIAB – Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira, Movimento Nacional de Direitos Humanos, Observatório das Metrópoles, OLODUM, RESAMA – Rede Sul-Americana para as Migrações Ambientais, Justiça Global, Cedeca, Engajamundo e IMUNE-MT – Instituto de Mulheres Negras de Mato Grosso 

A campanha, lançada em junho, exige que o Procurador Geral da República, Augusto Aras, não deixe impunes os possíveis crimes apontados pela CPI da Covid. E que todas as pessoas apontadas pelo relatório final da CPI sejam processadas judicialmente e devidamente responsabilizadas.  

Assine a petição e exija justiça!

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