A constante investida das autoridades egípcias contra jovens ativistas é uma flagrante tentativa de esmagar o espírito das mentes mais audazes e brilhantes do país, e de cortar pela raiz qualquer ameaça futura ao seu regime, declarou a Anistia Internacional em um novo informe publicado hoje (30).

Generation Jail: Egypt’s youth go from protest to prison (Geração Cárcere: A juventude egípcia vai da manifestação para a prisão) enfoca os casos de 14 jovens entre os milhares que foram arbitrariamente detidos, reclusos e encarcerados no Egito durante os últimos dois anos em conexão com as manifestações. O relatório mostra que o Estado voltou-se por completo a ser um Estado policial.

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“Dois anos depois da derrubada do presidente Mohamed Morsi, os protestos em massa foram substituídos pelas detenções em massa. Ao atacar implacavelmente ativistas jovens do Egito, as autoridades estão esmagando as esperanças de um futuro melhor de toda uma geração”, disse Hassiba Hadj Sahraoui, vice-diretora do Programa da Anistia Internacional para o Oriente Médio e norte da África.

“Após o levante de 2011, os jovens egípcios foram exaltados como um raio de esperança tanto pelos dirigentes militares do país como por seus parceiros internacionais. Seu idealismo e compromisso com as demandas de ‘pão, liberdade e justiça social’ demonstraram ser uma crucial força motora para a mudança. No entanto, atualmente muitos destes jovens ativistas permanecem atrás das grades, o que indica explicitamente que o Egito voltou a um estado de repressão declarada.”

Mais de um ano depois de sua chegada ao poder, o governo de Abdel Fattah al Sisi não deu sinais de abandonar seu regime repressivo. A repressão fez com que mais de 41.000 pessoas fossem detidas, acusadas ou processadas por um delito penal, ou condenadas após julgamentos injustos, segundo as últimas estimativas realizadas por ativistas egípcios de direitos humanos.

“A magnitude da repressão é acachapante. As autoridades egípcias demonstraram que não se deterão diante de nada em sua tentativa de esmagar qualquer desafio a sua autoridade”, disse Hassiba Hadj Sahraoui.

“Entre os que estão atrás das grades há desde líderes do movimento juvenil aplaudidos internacionalmente até defensores e defensoras dos direitos humanos, passando por adolescentes detidos por usar camisetas com lemas contra a tortura.”

A Lei de Manifestações, aprovada em novembro de 2013, permite que as autoridades detenham e processem ao seu bel prazer manifestantes pacíficos e criminaliza o próprio ato de tomar as ruas sem autorização prévia. Também dá luz verde às forças de segurança para utilizar força excessiva e letal contra manifestantes pacíficos.

“A Lei de Manifestações se converteu em uma via rápida à prisão para manifestantes pacíficos, que estão sendo tratados como criminosos. Deve ser revogada imediatamente”, declarou Hassiba Hadj Sahraoui.

A repressão, que começou com as detenções, em julho de 2013, de Mohamed Morsi e seus partidários, entre eles dirigentes do alto escalão da Irmandade Muçulmana, foi rapidamente estendida para englobar todo o espectro político egípcio.

Entre os jovens que foram encarcerados arbitrariamente estão os proeminentes ativistas Ahmed Maher e Mojhamed Adel, do “Movimento Juvenil 6 de abril”, Ahmed Douma, conhecido blogueiro e manifestante, e Alaa Abd El Fattah, blogueiro e destacado crítico das autoridades que passou tempo na prisão durante o governo de Hosni Mubarak e durante o do Conselho Supremo das Forças Armadas.

Também estão presos os destacados defensor e defensora dos direitos humanos Yara Sallam e Mahienour El Massry.

Todos eles se uniram aos que foram detidos por protestar contra a derrubada do presidente Mohamed Morsi, como o cidadão irlandês Ibrahim Halawa, os estudantes universitários Abrar Al Anany e Menatalla Moustafa e o professor Yousra Elkhateeb.

Todos foram encarcerados por desafiar a draconiana Lei de Manifestações egípcia, ou outra legislação que restringe arbitrariamente o direito à liberdade de reunião pacífica.

Em meados de 2015 ocorreu uma nova onda de detenções na qual ao menos 160 pessoas foram presas em condições que constituíam desaparecimento forçado, segundo o grupo de ativistas egípcio Liberdade para os Valentes. De sua parte, a Irmandade Muçulmana informou novas detenções de seus membros.

As autoridades egípcias trataram frequentemente de justificar suas táticas de mão de ferro dizendo que mantêm a estabilidade e a segurança. Embora alguns manifestantes tenham usado violência durante os protestos, a resposta das forças de segurança foi sistematicamente desproporcional.

Muitas das pessoas detidas foram levadas ante um tribunal por acusações falsas ou politicamente motivadas, ou foram condenadas durante julgamentos coletivos nos quais foram declaradas culpadas centenas de pessoas sem provas, ou exclusivamente pelo testemunho das forças de segurança ou procedentes de investigações do Serviço de Segurança Nacional.

Outras foram detidas durante períodos prolongados sem acusação nem julgamento. Entre elas está o estudante Mahmoud Mohamed Ahmed Hussein, que tinha apenas 18 anos quando foi detido por causa do lema impresso em sua camiseta, quando se dirigia para casa após um protesto.

Segundo sua família e advogados, ele foi torturado para “confessar” atividades relacionadas com o terrorismo. Passou seu aniversário de 19 anos na prisão e está há mais de 500 dias preso sem acusações nem julgamento.

Os milhares de manifestantes condenados por acusações falsas ou por leis que restringem arbitrariamente a liberdade de reunião pacífica e expressão contrastam fortemente com o baixíssimo número de membros das forças de segurança processados por violações de direitos humanos desde janeiro de 2011. Nem um único membro das forças de segurança enfrentaram acusações penais pela morte de centenas de simpatizantes de Morsi nas praças de Rabaa Adawiya e Al Nadha, em 14 de agosto de 2013.

A Anistia Internacional advertiu aos parceiros internacionais do Egito que não sacrifiquem os direitos humanos em suas conversações com as autoridades.

Os dirigentes de influentes países da UE, como França, Itália e Alemanha, sentaram-se com o presidente Abdel Fattah al Sisi enquanto seu governo encarcerava milhares de seus opositores políticos. E não há nenhum indício de que na ordem do dia destas reuniões estivesse deter as graves violações dos direitos humanos cometidas no Egito.

O Reino Unido também convidou o presidente Al Sisi para conversações; um porta-voz confirmou a noticia apenas um dia depois de um tribunal condenar à morte, após um julgamento injusto, o presidente deposto Mohamed Morsi.

O governo norte-americano anunciou em março que ia suspender o congelamento das transferências de armas ao Egito, e também está disposto a oferecer assistência militar e de segurança continuada ao exército e às forças de segurança do país.

“A hipocrisia entre os parceiros do Egito ficou patente em uma correria para obter lucrativos tratados comerciais, influência política e informação secreta, assim como novas vendas e transferências de equipamento policial que poderiam facilitar as violações dos direitos humanos”, disse Hassiba Hadj Sahraoui.

“Os dirigentes mundiais estão rompendo as promessas que fizeram de apoiar os jovens egípcios quando Mubarak caiu em fevereiro de 2011. O Egito está encarcerando ativistas pacíficos enquanto a comunidade internacional desvia o olhar. Os Estados guardam silêncio, como também o guardam os dirigentes mundiais e o Conselho de Direitos Humanos da ONU.”

As autoridades justificaram a repressão apontando um aumento na violência política. O Egito está sofrendo ataques de grupos armados que, segundo as autoridades, provocaram a morte de centenas de membros das forças de segurança, especialmente no norte da península do Sinai, assim como a de vários civis. A Anistia Internacional condena sem reservas os ataques a civis. No entanto, a organização insta as autoridades egípcias a não utilizar essas ameaças como pretexto para pisotear os direitos humanos.

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