• Ninguém foi processado pelo homicídio de 34 trabalhadores mineiros em greve, e por ferimentos em pelo menos outros 70;
  • Os mineiros e suas famílias ainda vivem em moradias inadequadas e em condições miseráveis;
  • As autoridades devem garantir que as vítimas e os parentes sejam devidamente indenizados.

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Cinco anos depois, as vítimas da sangrenta tragédia em Marikana, na qual 34 manifestantes foram mortos e pelo menos 70 feridos por membros do Serviço Policial da África do Sul (SAPS) durante uma greve de mineradores, ainda aguardam que se faça justiça, disse hoje a Anistia Internacional.

A organização pede às autoridades sul-africanas que assegurem que as pessoas suspeitas de responsabilidade penal em relação aos assassinatos de 16 de agosto de 2012 sejam levadas a julgamento e que as vítimas e suas famílias recebam reparações, incluindo indenizações adequadas.

“A tragédia dos assassinatos de Marikana é agravada pelo fato chocante de que nenhum dos responsáveis pelo derramamento de sangue tenha sido responsabilizado”, disse Shenilla Mohamed, Diretora Executiva da Anistia Internacional na África do Sul.

“Se o governo sul-africano quiser mostrar que está comprometido com a verdade e os direitos humanos, ele precisa garantir que a engrenagem da justiça funcione com mais rapidez, em comparação aos últimos cinco anos”.

Em junho de 2015, a Comissão Farlam, que foi criada pelo governo sul-africano para analisar as circunstâncias dos assassinatos, recomendou uma investigação completa sob a direção do Procurador Geral, com o objetivo de verificar a responsabilidade criminal dos membros do SAPS envolvidos nos eventos na Marikana.

Em dezembro de 2016, o presidente Jacob Zuma anunciou que seriam incriminados policiais de alto escalão, envolvidos nos assassinatos.

Em março de 2017, o órgão de fiscalização policial da Diretoria Independente de Investigação da Polícia (IPID) identificou 72 policiais a serem processados ​​em relação ao papel desempenhado nos homicídios de Marikana. Os registros foram submetidos à Autoridade Nacional de Fiscalização em maio.

Até agora, no entanto, nenhum policial envolvido foi processado.

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Justiça adiada – as vítimas se manifestam cinco anos depois

Em julho de 2017, a Anistia Internacional se encontrou com algumas das vítimas dos tiroteios e suas famílias no assentamento informal de Nkaneng, perto da mina de Roland, de Lonmin, onde ainda vivem em casas inadequadas e condições miseráveis.

No relatório de 2016, ‘Smoke and Mirrors: Lonmin’s failure to address housing conditions at Marikana’, a Anistia Internacional revelou como a empresa proprietária da mina, Lonmin Plc, com sede no Reino Unido, comprometeu-se a construir 5.500 casas os trabalhadores até 2011, seguindo seu Plano Social e Trabalhista (SLP) de 2006.

As aterradoras condições de habitação enfrentadas pelos empregados da Lonmin, juntamente com as queixas em relação aos baixos salários, foram os principais fatores determinantes da greve.

Muitos dos que a Anistia Internacional entrevistou expressaram sua revolta e decepção quanto ao pouco que mudou nesses cinco anos depois dos assassinatos.

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  • *Johannes Khwedu, ex-empregado da Lonmin, cujo amigo de infância foi morto em Marikana, disse que ficou chocado com o fato de não ter havido nenhuma ação movida contra a polícia que atirou nos mineiros manifestantes diante das câmeras de televisões internacionais.

“Como podem matar tantas pessoas sem sofrer as consequências? O governo deve prender aqueles que os mataram”, disse ele à Anistia Internacional.

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  • *Justin Kolobe, ex-perfurador de rocha na mina de Lonmin, que sobreviveu ao tiroteio, mas ficou permanentemente paralisado, continua à espera de justiça e reparação. Ele responsabiliza o governo sul-africano pela falta de progresso.

“Não há nada acontecendo para as pessoas que atiraram em nós. Este é o trabalho do governo. Se eles não querem que nada aconteça, nada vai acontecer. Esqueça”, disse ele.

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  • *Sarafina Jobe perdeu o marido, empregado da Marikana, nos tiroteios e luta para alimentar e cuidar da família sem os R2850 (US$ 215) que ele enviaria para casa a cada mês.

Ela contou à Anistia Internacional: “Sinto muita dor, às vezes, quando penso que ele se foi. Meu coração acelera, meu peito dói, e me dói a cabeça quando penso nisso à noite. Queremos indenização, e queremos saber como morreram os nossos maridos, quem os matou e por que razão. Essa é a única maneira de reconhecer que perdemos uma alma e que ele nunca poderá ser substituído”.

* Seus nomes reais foram alterados para protegê-los de represália.

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Contexto

Em 16 de agosto de 2012, o Serviço Policial da África do Sul (SAPS) alvejou fatalmente 34 homens em Marikana. Mais de 70 outros foram gravemente feridos.

Os homens eram empregados da Lonmin e estavam em greve e faziam ações de protesto quanto a salários e condições na mina.

Patologistas forenses independentes e estaduais que realizaram as autópsias nos 34 homens mortos em 16 de agosto descobriram que 30 deles morreram como resultado de lesões causadas por munição policial de alta velocidade de rifles de assalto R5. As lesões fatais em outros três casos foram causadas por munições de armas de fogo e, em um caso, por munição de espingarda.

Os assassinatos ocorridos em 16 de agosto vieram em meio à crescente tensão nos dias que antecederam a greve.

Três mineiros em greve foram mortos pela polícia em 13 de agosto e dois agentes de segurança da Lonmin, dois policiais e três mineiros não-grevistas foram mortos – aparentemente por pessoas do grupo dos grevistas – entre 12 e 14 de agosto.

Em agosto de 2017, a autoridade nacional encarregada dos procedimentos judiciais adiou indefinidamente o julgamento de 17 líderes grevistas ligados aos assassinatos ocorridos entre 12 e 14 de agosto de 2012.

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