Os decretos federais que permitem a desapropriação de imóveis rurais localizados na área dos territórios quilombolas do Charco e de Santa Rosa dos Pretos no Maranhão são uma vitória para os direitos das famílias das duas comunidades. Apesar de ter demorado três anos, a decisão, divulgada em 23 de junho no Diário Oficial da União, é mais um passo para que as comunidades tenham acesso às terras a que têm direito – direito esse garantido pela Constituição Federal de 1988. Além do Maranhão, comunidades quilombolas em Santa Catarina, Bahia, Pernambuco, Ceará, Paraná, Pará e Rio de Janeiro, também foram beneficiadas em outros decretos.

Para Sandra Santos, advogada da Comissão Pastoral da Terra do Maranhão (CPT), emitir um decreto federal pela desapropriação das terras é um “sinal positivo em direção à titulação definitiva das terras, mas ainda é um passo pequeno”.

“O que esse decreto significa é o Estado brasileiro dizendo que tem interesse neste território para devolver à comunidade quilombola o que lhe foi tirado. Mas o que foi aprovado foi apenas o decreto federal, ainda temos uma boa caminhada pela frente antes da desapropriação de fato. Agora, o Incra precisa fazer a avaliação dos imóveis que estão no território para poder entrar com a ação de desapropriação,” disse Sandra Santos.

O Incra já havia concluído o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade do Charco desde 2012. No entanto, sem a titulação definitiva, as famílias se encontravam em situação de vulnerabilidade, inseguras de sua permanência no local.

“Uma vez concluído o processo [de titulação definitiva das terras] na justiça, uma vez nas mãos do povo de forma legal, eles vão sentir mais firmeza e tranquilidade para usar e transitar livremente pelo território, sem medo de passar por intimidação de fazendeiros”, afirmou Sandra.

Esta poderá ser a primeira titulação de terras quilombolas no estado do Maranhão por parte do Governo Federal. Apesar do estado conter cerca de mil comunidades quilombolas, pouco mais de 400 tiveram certificado de reconhecimento emitido pela Fundação Palmares, e menos de dez tiveram o RTID concluído pelo INCRA.

“Esse é um passo importante para as comunidades de Santa Rosa dos Pretos e do Charco. Mas não podemos deixar de olhar para a situação dramática das comunidades quilombolas no estado do Maranhão como um todo. A longa demora no processo de identificação e titulação de terras quilombolas deixa essas comunidades em situação de extrema vulnerabilidade, colocando em risco sua sobrevivência e deixando-as expostas a situações de conflitos que, muitas vezes, resultam em ataques diretos e morte de lideranças rurais, como foi o caso de Flaviano Pinto Neto, liderança do Charco assassinada em outubro de 2010,” Renata Neder, assessora de direitos humanos da Anistia Internacional no Brasil.

A Anistia Internacional fez campanha em defesa da Comunidade do Charco na Maratona de Cartas Escreva por Direitos, em dezembro de 2014. Em maio deste ano, foram entregues 4 mil cartas coletadas pedindo a titulação definitiva das terras em uma reunião com o Ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias.

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