Centenas de milhares se unem para pedir que El Salvador acabe com sua vergonhosa e discriminatória proibição ao aborto, que tem resultado na morte de mulheres e meninas e na prisão de muitas outras por complicações relacionadas à gravidez, às vezes por até 40 anos, segundo a Anistia Internacional.

Hoje (22), a diretora para as Américas da organização, Erika Guevara-Rosas, irá apresentar uma petição contendo mais de 300.000 assinaturas ao gabinete do presidente de El Salvador Sánchez Cerén, pedindo a revogação da proibição ao aborto no país.

“Por quase duas décadas, as mulheres em El Salvador têm sofrido as consequências dessa lei ultrapassada, severa, e agora 300.000 vozes da comunidade global se juntam à sua luta para parar a injustiça. Esse é agora um coral ensurdecedor de preocupação que não pode ser ignorado. O presidente Cerén deve considerar seriamente esse chamado”, disse Erika Guevara-Rosas.

“Essa proibição cruel e discriminatória não tem lugar numa sociedade moderna, onde mulheres e garotas devem ter controle sobre sua saúde e decisões reprodutivas. A proibição tem levado mulheres à prisão há décadas devido a complicações obstetrícias, e forçado outras a abortos perigosos, clandestinos, que frequentemente acabam com a sua morte.”

Membros da Anistia Internacional e ativistas de todo mundo estão se juntando a grupos locais de defesa dos direitos das mulheres para pedir que as autoridades de El Salvador assegurem a mulheres e garotas o acesso a serviços de aborto seguros e legais, pelo menos, quando a gravidez representar risco para suas vidas ou quando for resultado de estupro ou nos casos de grave má-formação fetal.

As leis repressivas do país fazem com que mulheres e meninas condenadas por aborto possam pegar de dois a oito anos de cadeia. A proibição ao aborto compreende até garotas que foram estupradas. Isso acaba forçando qualquer uma a prosseguir com a gravidez até o fim, mesmo que acarrete efeitos físicos e psicológicos devastadores. Profissionais de saúde também podem cumprir pena se condenados por facilitar abortos.

A proibição tem criado um medo de processos tão intenso que agora os médicos ligam para a polícia sempre que mulheres e garotas sofrem aborto espontâneo. Isso leva à condenação de mulheres por homicídio grave, pegando até 40 anos de prisão por nada além de uma gravidez interrompida.

A Anistia Internacional tem atuado no caso de 17 mulheres, conhecida como “Las 17”, todas encarceradas por crimes relacionados com gravidez. Uma dessas mulheres, Carmen Guadalupe Vásquez Aldana, recebeu perdão presidencial em janeiro, depois que as autoridades reconheceram que ocorreram “erros judiciais” no processo original. Ela finalmente foi libertada da prisão depois de sete anos, em 22 de janeiro de 2015. Outra mulher foi solta no último ano após ter cumprido sua sentença, mas 15 ainda seguem atrás das grades.

A Anistia Internacional está pedindo liberdade imediatamente para todas as mulheres e garotas presas por aborto ou condenadas por complicações relacionadas à gravidez.

“Da Argentina à Suíça, pessoas do mundo inteiro observam El Salvador, esperando que a justiça prevaleça. Não iremos nos esquecer das dezenas de mulheres sofrendo nas prisões nem das sobreviventes de estupros forçadas a prosseguir com a gravidez até o fim,” disse Erika Guevara-Rosas.

“Não devemos esquecer as mulheres e garotas que encaram a face da morte, ou por uma gravidez que pode matá-las ou por terem de se submeter a um aborto inseguro, clandestino. Só podemos esperar que essa petição lembre ao presidente Sánchez Cerén e a outras autoridades do país que eles também não devem esquecer essas mulheres e garotas. Nós não vamos.”

Outras informações

Cinco outros países latino-americanos têm proibições ao aborto similares – Chile, Haiti, Honduras, Nicarágua e Suriname. Dentre eles, o Chile tem empreendido medidas para retificar sua legislação: em janeiro, a presidente Michelle Bachelet apresentou ao Congresso o esboço de uma lei que permitiria o aborto quando a vida da mãe estivesse em risco; se o feto não pudesse sobreviver; ou em casos de estupro. Se aprovada, a lei revogaria a proibição total ao aborto, vigente no país desde 1989. Em dezembro, a República Dominicana descriminalizou o aborto em casos de estupro, incesto, má-formação fetal ou quando a vida da mãe estiver em risco.

Em março de 2014, a Anistia Internacional lançou uma campanha global para proteger o direito das pessoas a decidir sobre sua saúde, corpo, sexualidade e reprodução, sem receio de discriminação ou controle ou coerção estatal. A campanha ‘Meu Corpo, Meus Direitos’ exige que os governos descriminalizem o aborto.

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Doze fatos sobre a proibição do aborto em El Salvador

Relatório: À beira da morte: Violência contra mulheres e proibição do aborto em El Salvador