Ativistas, advogados e advogadas, jornalistas, líderes comunitários e sindicalistas: todos os defensores e defensoras de diretos humanos que põem sua vida e sua liberdade em perigo lutando pelos direitos humanos, continuam sofrendo intimidação e violência na América Latina e no Caribe, declarou a Anistia Internacional em um novo informe publicado hoje (9/12).

O relatório, intitulado Defender Direitos Humanos: Necessário, Legítimo e Perigoso que é apresentado no Dia dos Defensores e das Defensoras dos Direitos Humanos, oferece uma perspectiva geral da situação dos que defendem os direitos humanos na região. O informe se centra principalmente em mais de 200 casos de ataques e abusos sobre os quais a Anistia Internacional tem atuado durante os dois últimos anos.

“A trágica realidade é que muitas das pessoas que defendem os direitos humanos na América Latina e no Caribe sofrem perseguição e ataques constantes em represália por seu trabalho. Em diversos países temos observado um incremento, inquietante e vergonhoso, do nível de violência e repressão sofrido por estas pessoas apenas por defender os direitos humanos e a justiça”, disse Erika Guevara Rosas, diretora do Programa para a América da Anistia Internacional.

“É angustiante contemplar o tipo e a frequência das covardes tentativas de silenciar e intimidar os que trabalham para lançar luz sobre os abusos contra os direitos humanos. E, mesmo assim, estas admiráveis pessoas continuam lutando, mesmo ante semelhante repressão. É imperativo que os dirigentes da América redobrem seus esforços e façam mais para proteger os que defendem os direitos humanos.”

O relatório baseia-se em casos da Argentina, Bolívia, Brasil, Colômbia, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Venezuela.

A investigação documentou níveis especialmente altos de violência e repressão contra os que trabalham em questões relativas à terra, ao território e aos recursos naturais, contra os que trabalham com os direitos das mulheres e meninas, com os direitos das pessoas que se identificam como lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros ou intersexuais (LGBTI), e com os direitos de pessoas imigrantes, bem como contra jornalistas e sindicalistas que defendem os direitos humanos.

Morte e violência

Em alguns países tem havido um aumento meteórico das ameaças e dos ataques contra defensores e defensoras. Enquanto isso, as autoridades estatais de toda a região esquivam-se de seu dever de abordar o crescente problema.

A Colômbia é um dos países onde a situação é mais grave. Ali, segundo o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, pelo menos 40 defensores e defensoras foram vítimas de homicídio nos nove primeiros meses de 2014. Entre setembro e outubro deste ano, mais de uma centena de ativistas e defensores e defensoras de direitos humanos receberam uma série de ameaças de morte por correio eletrônico enviadas por grupos paramilitares.

“Com frequência, os assassinatos de defensores e defensoras de direitos humanos poderiam ter sido evitados se as autoridades estatais tivessem atendido devidamente as denúncias e investigado as ameaças e atos de intimidação dos quais estas pessoas foram vítima. Os dirigentes estatais da região devem fazer mais para abordar estes problemas e para oferecer uma proteção efetiva aos defensores e defensoras em perigo”, declarou Nancy Tapias Torrado, pesquisadora da Anistia Internacional sobre a Situação de Defensores e Defensoras de direitos humanos na América.

Direito à terra e questões de território

A pesquisa da Anistia Internacional concluiu que os que trabalham com os direitos humanos em relação com a terra, território e recursos naturais na região, pagam um alto preço por seu trabalho.

Em um caso emblemático de Honduras, em 27 de agosto de 2014 Margarita Murillo foi morta a tiros. Anteriormente havia denunciado ameaças e intimidação. Era defensora e líder comunitária, e há mais de 40 anos lutava pelos direitos das comunidades camponesas, para que pudessem melhorar suas condições de vida.

Violência de gênero e discriminação

Os que trabalham com os direitos das mulheres e meninas e com os direitos das pessoas que se identificam como lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros ou intersexuais (LGBTI) também correm especial perigo.

A Anistia Internacional realizou dezenas de entrevistas com mulheres defensoras que não apenas sofrem repressão por seu trabalho de defesa dos direitos humanos, mas também lutam contra a desigualdade e a discriminação e são objeto de ameaças e ataques por causa de seu gênero.

Em El Salvador, as defensoras dos direitos humanos que lutam contra a proibição total do aborto e suas consequências fatais têm sofrido intimidação e estigmatização constantes. Algumas têm sido ameaçadas de serem levadas a julgamento caso sigam com seu trabalho em apoio a mulheres vulneráveis que têm sido injustamente encarceradas por terem sofrido abortos.

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Os Estados ainda não adotaram nem implementaram medidas de proteção específicas e efetivas para que as defensoras dos direitos humanos possam fazer frente aos riscos específicos que correm.

De igual modo, os que defendem os direitos do grupo LGBTI sofrem numerosos ataques devido a seu trabalho. Este tem sido um problema especialmente grave no Caribe.

Em agosto de 2014, após ter recebido ameaças de morte contra ele e sua família, Javed Jaghai, membro da organização J-FLAG (Forum of Lesbians, All-Sexuals and Gays), retirou um recurso de inconstitucionalidade contra as leis que criminalizam as relações sexuais entre homens.

Castigo por defender os direitos humanos

A Anistia Internacional também tem observado como são utilizados os sistemas judiciais para reprimir os que defendem os direitos humanos e impedir seu trabalho.

Bettina Cruz Velázquez é integrante e cofundadora da Assembleia dos Povos Indígenas do Istmo de Tehuantepec em Defesa da Terra e do Território (APIITDTT) no México. Desde 2011, enfrenta acusações penais infundadas de privação ilegal da liberdade e delitos contra “o consumo e a riqueza nacional”. Seu único “delito” foi proteger os direitos dos povos indígenas em relação à construção de um parque eólico em suas terras.

“Infelizmente, na América Latina e no Caribe é cada vez mais comum que os defensores e defensoras dos direitos humanos enfrentem acusações infundadas e detenções injustas. É muito preocupante que as autoridades não erradiquem o uso indevido do sistema de Justiça como meio de repressão”, declarou Nancy Tapias Torrado.

Avanços

O informe destaca que os ganhos alcançados no direito regional e internacional ainda não foram implementados pelos governos do continente.

“Embora as normas internacionais sobre a proteção dos defensores e defensoras dos direitos humanos tenham avançado, ainda resta um longo caminho a percorrer para os que estão na linha de frente do trabalho de direitos humanos gozem do respeito e da proteção que tão claramente necessitam”, disse Erika Guevara Rosas.

“Instamos os governos de toda a região a fazer frente ao desafio e cumprir com sua obrigação de proteger os que defendem os direitos humanos, para que assim estas pessoas, fonte de inspiração, possam continuar com sua luta a favor dos direitos.”

Veja também o informe Transformando Dor em Esperança: Defensoras e Defensores de Direitos Humanos na América