O governo do Paquistão deve pôr um fim imediato à onda de execuções que está ocorrendo no país depois do ataque contra a escola de Peshawar, que matou 19 pessoas no último mês, disse a Anistia Internacional.

Desde que se levantou a moratória das execuções em 17 de dezembro, o Paquistão ameaça levar à forca cerca de 500 presos condenados à morte por acusações de terrorismo. Há outra execução – a de Ikramul Haq, membro do grupo armado Lashkar e Jhangvi condenado por assassinar um muçulmano em 2004 – que estava prevista para sábado (17) em Lahore.

“A onda de assassinatos que está se desenvolvendo no Paquistão deve acabar imediatamente. Por mais atroz que tenha sido o ataque de Peshawar, demonstrar força contra o crime matando mais pessoas não é nunca a resposta para combater a violência”, afirmou David Griffiths, diretor-adjunto do Programa Regional para a Ásia e Oceania da Anistia Internacional.

“O governo deve restabelecer imediatamente a moratória das execuções com vistas à abolição definitiva da pena de morte”.

A Anistia Internacional, que se opõe à pena de morte em todas as circunstâncias, considera que seu uso no Paquistão é ainda mais preocupante, pois muitas das condenações a esta pena foram impostas em julgamentos claramente injustos.

“O sistema legal paquistanês está repleto de graves problemas que afetam a todos os níveis da imparcialidade processual, em particular nos casos de terrorismo, que costumam tramitar apressadamente. O uso frequente da tortura para obter supostas ‘confissões’, a falta de acesso à representação legal, e os longos períodos de detenção sem acusação são apenas alguns dos nossos motivos de preocupação. Existe o risco real de que se tenha condenado à morte pessoas cujas declarações de culpabilidade são duvidosas”, acrescentou David Griffiths.

Alguns dos presos executados até agora e os que correm risco de sê-lo foram condenados por Tribunais Antiterroristas que suspendem direitos fundamentais dos processados ao realizar julgamentos em ausência ou usando como prova declarações obtidas sob tortura. Além disso, pressionam-se os juízes para que concluam as audiências em sete dias úteis.

Nas últimas semanas, o Paquistão reformou sua Constituição para acelerar o julgamento dos casos de terrorismo e transferi-los dos tribunais civis para os militares.

A competência dos tribunais militares sobre os casos de terrorismo suscita grande preocupação com as garantias de imparcialidade processual, pois a presteza para obter condenações rápidas por terrorismo poderia favorecer a violação de direitos.

“As últimas medidas para acelerar os julgamentos de casos de terrorismo ante tribunais militares estão levando o Paquistão por um caminho perigoso. Os tribunais militares nunca devem ser usados para julgar civis em nenhuma circunstância. Não há desculpa para sacrificar o direito a um julgamento justo em pautas de segurança nacional” concluiu Griffiths.

Julgamentos em tribunais militares

A jurisdição militar deve estar limitada unicamente a julgar pessoal militar acusado de infrações puramente militares ou disciplinares. Os tribunais militares costumam descumprir requisitos sobre a independência ou a imparcialidade dos juízes e caracteriza-se por impor períodos prolongados de prisão preventiva, a falta de acesso a advogados e a inexistência do direito de apelar contra a sentença.

Além disso, a tortura abunda nos centros de detenção da polícia e do exército do Paquistão, e as declarações obtidas mediante tortura continuam sendo usadas como prova nos tribunais.

Uma definição de terrorismo abrangente

Muitas das pessoas condenadas à morte por atos de terrorismo foram declaradas culpadas, na realidade, por crimes que pouco tem a ver com a ideia convencional de terrorismo. Segundo um estudo do Justice Project Pakistan (JPP), dos 6.872 presos condenados à morte do Paquistão em 2012 (atualmente são mais de 8.000), 818 foram julgados por acusações relacionadas ao terrorismo.

A definição de terrorismo contida na Lei Antiterrorista do Paquistão, de 1997, é tão geral que pode abranger quase todos os crimes. As conclusões do JPP revelam que 256 destes 818 casos conhecidos de julgamento por “terrorismo” não tinham relação com o terrorismo e foram declarados culpados em aplicação do Código Penal paquistanês, e não da legislação antiterrorista. Alguns dos atos que os estavam acusando não podiam ser considerados os “mais graves crimes” pelos quais cabe impor a pena de morte em virtude do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, do qual o Paquistão é Estado Parte.

A Anistia Internacional se opõe à pena de morte em todos os casos e circunstâncias, independente da natureza do crime, das características do infrator e do método empregado pelo Estado para realizar a execução. A organização considera que a pena de morte é uma violação do direito à vida reconhecido na Declaração Universal de Direitos Humanos, e é o castigo cruel, desumano e degradante por excelência.