Enquanto nigerianos se preparam para ir às urnas para eleger o seu presidente em 28 de março, vamos dar uma olhada em algumas das principais questões de direitos humanos que as pessoas que vivem no país mais populoso e rico em petróleo da África enfrentam.
Quão ruim é a situação dos direitos humanos na Nigéria?
Muito chocante. Ataques sangrentos do Boko Haram no nordeste da Nigéria e a pesada resposta dos militares já mataram milhares de civis e forçaram centenas de milhares a fugir. Mulheres, homens e crianças vivem em constante medo de assassinato e sequestro pelo Boko Haram e de prisão arbitrária, detenção ilegal, tortura e mesmo de execução pelas mãos dos militares.
Mas não é apenas a violência no nordeste do país, que é extremamente preocupante. Os problemas dentro do sistema de justiça da Nigéria, por exemplo, são profundamente enraizados.
68% das 55 mil pessoas detidas em prisões superlotadas da Nigéria foram condenadas, mas estão à espera, muitos há anos, para que seus casos sejam concluídos. Aqueles que foram condenados, frequentemente enfrentaram julgamentos injustos – com muitos tendo sofrido tortura e sem acesso a um advogado. Mais de mil pessoas estão definhando no corredor da morte, esperando o dia em que o Estado decidirá matá-las. Ironicamente, aqueles que cometem violações dos direitos humanos raramente enfrentam um processo.
A pobreza e a desigualdade também são questões importantes, com milhões de pessoas sem acesso à moradia adequada, sendo expulsas à força de suas casas e até mesmo sem água potável.
Em torno do Delta do Níger, comunidades inteiras vivem à mercê de empresas de petróleo sem escrúpulos que poluíram as suas terras, devastando o meio ambiente que as pessoas dependem para comida, água e meios de subsistência. Os derramamentos de petróleo causados por oleodutos velhos e atividades ilegais, tais como roubo de petróleo são notórios e endêmicos, mas as empresas não limpam adequadamente, de forma alguma.
O Boko Haram não é responsável pela maioria dos problemas na Nigéria?
O grupo armado Boko Haram é responsável por grande parte da violência e da morte que abalou grandes partes da Nigéria.
Desde que o grupo iniciou a sua jornada de violência, depois que a polícia matou o líder do grupo em uma execução extrajudicial, em 2009, eles têm liderado uma campanha impiedosa de assassinatos e horror – com pelo menos 350 ataques e atentados entre 2013 e 2014 matando ao menos 5.400 civis.
Mas a ascensão de Boko Haram reflete os vários problemas enfrentados pela Nigéria moderna – incluindo a pobreza. O grupo é conhecido por ter recrutado jovens marginalizados, às vezes a força.
Mais uma vez, a falta de justiça por crimes de direito internacional e outras violações graves e abusos de direitos humanos é um grande problema. Assim como o governo não foi capaz de manter suas próprias forças, ele processou pouquíssimas pessoas suspeitas de serem membros ou simpatizantes do Boko Haram por crimes de direito internacional e por outras violações graves dos direitos humanos, como a tortura.
E sobre as meninas Chibok? O que aconteceu com elas?
As 276 estudantes sequestradas em abril de 2014 da Escola Secundária do Governo para Meninas Chibok são algumas das vítimas da campanha implacável do Boko Haram contra a autoridade secular e instituições na Nigéria.
Enquanto algumas das meninas escaparam de seus captores, 219 ainda estão desaparecidas.
Em vídeos postados on-line, o líder do Boko Haram Abubakar Shekau afirmou que o grupo tinha forçado as meninas a se casarem, mas, até agora, ninguém foi capaz de confirmar o que aconteceu com elas.
Os problemas da Nigéria não seriam resolvidos com melhores leis?
O problema na Nigéria não é a falta de leis. Na verdade, desde a independência, em 1960, a Nigéria já assinou acordos para uma série de tratados internacionais destinados a proteger os direitos humanos das pessoas. Mesmo a Constituição do país garante os direitos básicos das pessoas.
Enquanto a Nigéria ainda está para criminalizar a tortura e tem outras lacunas importantes em suas leis, é claro que um dos maiores problemas que o país enfrenta é a falta de cumprir e fazer cumprir as leis que já existem. Por exemplo, apesar de garantias constitucionais, as pessoas não têm acesso a seus advogados e familiares durante a detenção militar, a polícia não acusa ou libera suspeitos dentro de prazos constitucionalmente obrigatórios e o governo não faz cumprir as normas ambientais para as empresas de petróleo.
O que o governo está fazendo para acabar com os abusos contra o seu próprio povo?
O governo afirma que eles estão tentando parar o Boko Haram e fazer com que as pessoas tenham um país seguro. Eles também se comprometeram a acabar com as violações dos direitos humanos por parte das forças de segurança e fazer dos tratados internacionais de direitos humanos parte das legislações nacionais, incluindo a criminalização da tortura.
Na realidade, porém, o problema é que os responsáveis por violações dos direitos humanos, incluindo os membros das forças armadas e da polícia, raramente são responsabilizados, transmitindo a mensagem de que eles podem fugir disso.
Apesar de uma posição oficial por parte das autoridades de que as violações dos direitos humanos por parte dos militares e da polícia na Nigéria acontecem por causa de alguns “ovos podres”, as evidências mostram que os problemas são sistemáticos.
Mas o que eles podem fazer para mudar essa situação?
Existem alguns passos que as autoridades poderiam, e deveriam, tomar sem demora. Eles incluem: o início de um plano completo para reformar a polícia e o setor judiciário, impondo uma moratória sobre as execuções, tendo em vista, em última análise a abolição da pena de morte e a introdução de uma lei para estabelecer salvaguardas contra despejos forçados.
A melhoria da situação dos direitos humanos na Nigéria requer vontade política. Algumas das mudanças terá outros investimentos financeiros apenas na execução e aplicação da legislação e regulamentos existentes.
Vocês estão preocupados com a violência em potencial em torno das eleições?
As tensões na Nigéria estão muito altas e, infelizmente, o país tem um histórico de violência relacionada com as eleições. É importante que os candidatos, o governo e as forças de segurança respeitem os direitos humanos durante as eleições e além.
Os líderes e os candidatos devem abster-se de retóricas de campanha inflamatórias e as forças do governo e de segurança devem fazer tudo ao seu alcance para garantir a proteção de civis e o respeito pelos direitos humanos, antes, durante e depois das eleições.
Vocês têm alguma esperança de que as coisas vão realmente mudar após as eleições? O que vocês gostariam de ver o novo governo fazendo?
Estamos pedindo ao novo governo para colocar os direitos humanos no topo da sua agenda a fim de quebrar o ciclo de violência de âmbito nacional da Nigéria.
O novo governo deve iniciar investigações independentes, imparciais e exaustivas sobre as alegações de crimes de direito internacional, incluindo crimes contra a humanidade e crimes de guerra cometidos por membros do Boko Haram e as forças armadas nigerianas. Eles também devem tomar medidas imediatas para garantir a segurança e proteção de civis e suas propriedades nas comunidades afetadas pela violência em curso.
Além das áreas de conflito, o governo deve tomar medidas robustas para acabar com a tortura, inclusive criminalizando-a e trazendo todos os responsáveis por cometê-la à justiça. As autoridades devem também suspender todas as expulsões forçadas e garantir que as pessoas não vivam sob a constante ameaça de perder suas casas.
Nigéria: Os direitos humanos em números
166.600.000: Número de pessoas que vivem na Nigéria (ONU, 2012). Cerca de metade da população tem menos de 18 anos.
9.000.000: Número de crianças órfãs, de acordo com a UNICEF.
7.4%: a porcentagem de crianças que não sobrevivem ao primeiro ano.
52/53: expectativa de vida para homens e mulheres, respectivamente (ONU).
3.005.51 USD: Produto Interno Bruto (Banco Mundial, 2013).
70%: Porcentagem que o setor de petróleo e gás representa da receita do governo da Nigéria.
Um em cada três: nigerianos que vivem em favelas ou assentamentos informais em pobres condições de superlotação, com acesso limitado à água potável e em constante ameaça de remoção forçada.
2 milhões: Número de pessoas removidas à força de suas casas desde 2000. Muitos ainda estão desabrigadas.
19%: Número de casas em áreas rurais com acesso a água potável.
38.000: Pessoas em prisões que não foram condenados por qualquer crime, sete em cada 10 do total da população prisional.