Foi inadequado o pacote de indenização do governo de Lagos, aprovado pelo Banco Mundial, para milhares de pessoas removidas de um assentamento informal, disse a Anistia Internacional em um relatório publicado hoje (20).

O relatório, At the mercy of the government [à mercê do governo], defende que os moradores de Badia Oriental, cujas casas foram derrubadas em 23 de fevereiro de 2013, não foram devidamente indenizados pelo governo por suas perdas, e que o Banco Mundial aprovou de forma indevida um processo de indenização incompatível com as normas internacionais de Direitos Humanos e com a política do próprio Banco.

“É um escândalo que uma comunidade, agora carente por causa das ações do governo do Estado de Lagos, não tenha obtido uma indenização efetiva desse mesmo governo, e com a cumplicidade do Banco Mundial”, disse Audrey Gaughran, diretor de Questões Globais da Anistia Internacional.

“A demolição de centenas de casas e comércios deu fim aos meios de subsistência e deixou milhares desabrigados. E sem o pagamento de indenizações eficazes, a situação das vítimas só piorou, algumas famílias se encontram em estado de miséria.”

O assentamento informal de Badia Oriental em Lagos foi escolhido para se beneficiar de um projeto financiado pelo Banco Mundial, que teve como objetivo melhorar o acesso a serviços básicos, através do investimento em infraestrutura. No entanto, a demolição de pelo menos 266 prédios ocorreu sem uma devida consulta ou aviso prévio adequado e razoável e sem reparação pela perda sofrida.

Após crescente pressão, o governo do estado de Lagos, em colaboração com o Banco Mundial, concordou em desenvolver e executar um Plano de Ação de Reassentamento retroativo (RAP) para os moradores de Badia Oriental em conformidade com a política do Banco Mundial sobre Reassentamento Involuntário. No entanto, tanto o conteúdo do RAP quanto o processo pelo qual foi preparado infringem as normas internacionais de Direitos Humanos e a política do Banco Mundial.

O RAP deixou de:

• oferecer opções de moradia ou transferência para outros locais alternativos adequados;

• garantir que as pessoas afetadas recebessem o apoio necessário para recompor sua subsistência e padrão de vida;

• cuidar devidamente das necessidades dos grupos desfavorecidos;

• indenizar e garantir indenização adequada às pessoas afetadas. Em vez disso, ofereceram “assistência financeira”, com quantidades determinadas de forma unilateral pelo governo e consideradas inadequadas pelas pessoas afetadas. Além disso, o governo do estado de Lagos descumpriu um acordo realizado entre uma comissão formada por ele e representantes da comunidade quanto à indenização. O Banco Mundial tinha conhecimento deste fato.

Apesar das faltas, o RAP foi aprovado pelo Banco Mundial. Este ainda cometeu mais uma violação da sua política ao não divulgar um esboço do RAP antes da aprovação, exacerbando as dificuldades que as pessoas afetadas enfrentaram ao se envolverem no processo.

Embora alguns dos afetados tenham pedido uma investigação completa do caso pelo Coletivo de Inspeção do Banco Mundial – uma entidade que deveria ser independente da administração do Banco – isto foi recusado e o Coletivo também endossou o RAP.

“O RAP – e o processo pelo qual foi desenvolvido – deixou de seguir os padrões de direitos humanos e não abordou o terrível impacto das remoções forçadas sofridas pela comunidade já vulnerável da Badia Oriental”, disse Audrey Gaughran.

“É imperativo que o governo do estado de Lagos atue imediatamente para garantir que todos os removidos à força de Badia Oriental sejam inteiramente indenizados por suas perdas e que os que não conseguirem moradias tenham a opção de alojamento alternativo adequado.”

“O Banco Mundial deve voltar a se entender com o governo do estado de Lagos neste caso, a fim de cumprir o seu dever de cuidar das pessoas afetadas por não seguir as normas de direitos humanos e suas próprias políticas.”

“Além disso, o governo da Nigéria precisa impor uma moratória sobre as remoções em massa até que seja adotada uma  legislação para proteger as pessoas de remoções forçadas, que são ilegais sob o direito internacional.”

Contexto

Em 23 de fevereiro de 2013, milhares de moradores de Badia Oriental no estado de Lagos ficaram desabrigadas quando as autoridades, apoiadas pela polícia, demoliram casas e prédios comerciais na comunidade.

Em Badia Oriental, não foi obedecida nenhuma das garantias legais e processuais exigidas pela legislação internacional de direitos humanos e normas com relação a despejos. Não houve consulta genuína com as pessoas afetadas para verificar alternativas para a remoção. O governo não deu o devido aviso prévio, recursos jurídicos, habitação alternativa para os incapazes de prover o próprio sustento ou indenização pela perda da propriedade. As demolições em Badia Oriental foram remoções forçadas que violam o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), um tratado do qual a Nigéria faz parte.

De acordo com as normas internacionais de direitos humanos, todas as pessoas, incluindo aquelas que vivem em assentamentos informais, têm direito a uma reparação efetiva quando seus direitos são violados. O direito à moradia e à segurança da pessoa e do lar são princípios básicos do direito internacional de direitos humanos.

Em setembro de 2013, o governo do estado de Lagos tinha negociado com os representantes das vítimas da remoção forçada de Badia Oriental, com vistas ao pagamento de uma indemnização. O Banco Mundial monitorou o desenvolvimento de um Plano de Ação de Reassentamento (RAP) pelo governo do estado de Lagos.

Em novembro de 2013, o governo de Lagos reduziu o montante da indenização que tinha inicialmente concordado em pagar no âmbito do RAP. Em dezembro de 2013, a comunidade Badia Oriental aceitou a oferta reduzida de indenização com restrições.

As restrições incluíam o seguinte: que o governo realizasse uma “revisão ascendente” do pacote de indenizações no futuro; que todos os proprietários de prédios tivessem o direito de recusar o esquema habitacional que o governo quer construir no terreno disponível; e que o RAP fosse executado o mais rápido possível.

O governo rejeitou a aceitação condicional da proposta de indenização da comunidade, e esta ficou com a opção de aceitar incondicionalmente o pacote de indenizações reduzidas.

Em 30 de setembro de 2013, três pessoas afetadas, agindo em nome da comunidade de Badia Maior, requereram uma inspeção junto ao Coletivo de Inspeção do Banco Mundial. O Coletivo de Inspeção é um mecanismo de queixas de pessoas que julgam ter sido, ou possam ser prejudicadas por um projeto financiado pelo Banco Mundial para expressar suas preocupações e recorrer. Em 16 de julho de 2014, apesar de estar ciente das deficiências do RAP, o Coletivo decidiu não registrar o Requerimento.

Badia Oriental é um a das muitas comunidades em toda a Nigéria que foram destroçadas pelas remoções forçadas nos últimos anos.

Acesse o relatório: – At the mercy of the government: Violation of the right to effective remedy in Badia East, Lagos State  [À mercê do governo: Violação do direito a um recurso efetivo em Badia Oriental, Estado de Lagos]