A Anistia Internacional salientou hoje que, um ano após as revelações sobre o Projeto Pegasus, ainda não há acordo sobre uma suspensão global da venda de spyware, pelo que o setor de vigilância continua a operar sem controlo. O Projeto Pegasus expôs como governos de todo o mundo estavam usando o spyware invasivo Pegasus da empresa NSO Group para monitorar de forma ilegítima ativistas de direitos humanos, líderes políticos, jornalistas e profissionais do direito.
Após repetidos pedidos de regulamentação do setor de vigilância, alguns passos foram dados na direção certa, mas a ação do governo ainda não é suficiente.
“Um ano depois que as revelações do spyware Pegasus chocaram o mundo, é alarmante que as empresas de vigilância continuem lucrando com as violações globais dos direitos humanos”, disse Danna Ingleton, vice-diretora da Anistia Tech. “O Projeto Pegasus veio para nos lembrar da necessidade de agir com urgência para regular um setor que não tem controle. É vergonhoso que os governos do mundo continuem falhando em dar um passo à frente para lidar totalmente com essa crise de vigilância digital.” prosseguiu Ingleton.
Qualquer pessoa que tenha sido atacada com spyware do NSO Group tem direito à uma reparação eficaz. A falta de medidas significativas por parte dos governos de todo o mundo é um insulto àqueles que sofreram física ou psicologicamente devido aos ataques desse software invasivo.“A vigilância seletiva e ilegítima de defensores de direitos humanos e da sociedade civil é um instrumento de repressão. Chegou a hora de controlar esse setor, que continua operando nas sombras.”
“A vigilância seletiva e ilegítima de defensores de direitos humanos e da sociedade civil é um instrumento de repressão. Chegou a hora de controlar esse setor, que continua operando nas sombras.” – Danna Ingleton, vice-diretora da Anistia Tech
A jornalista Julia Gavarrete, de El Salvador, diz: “É uma pena que um instrumento tão poderoso de combate ao crime seja usado para atacar jornalistas independentes e defensores de direitos humanos. Pena que não temos ideia de quem estava se escondendo por trás dos ataques! É impossível não sentir raiva quando toda a sua vida está nas mãos de outra pessoa e não há respostas sobre quem é o responsável por isso.
Ser objeto de vigilância me levou a mudar a maneira como me comunico e os lugares que vou, e a pensar duas vezes sobre o tipo de informação que quero compartilhar com outras pessoas, não apenas para minha própria segurança, mas para proteger a integridade de aqueles que eles se comunicam comigo. Tenho que ter cuidado com os lugares que visitamos e estar muito atento sempre que temos nossos dispositivos por perto. Como jornalista, tenho que proteger minhas fontes, mas como mulher, tenho que proteger minha família e amigos. A vigilância constitui um atentado à dignidade da nossa vida profissional e privada”.
Esse é o objetivo deles: deixar você paranóico, isolá-lo das pessoas e prendê-lo em uma prisão – Hicham Mansouri, jornalista marroquino
Hicham Mansouri, jornalista marroquino radicado na França, descreve os ataques como “uma forma muito violenta de censura, porque nos privamos de expressar nossas opiniões sobre muitos assuntos, tanto profissionalmente quanto pessoalmente”. Ele então acrescenta: “Esse é o objetivo deles: deixar você paranóico, isolá-lo das pessoas e prendê-lo em uma prisão”.
Investigações em andamento
Atualmente, existem investigações abertas e processos judiciais pendentes contra o NSO Group na França, Índia, México, Polônia e Espanha. Em março, o Parlamento Europeu criou a Comissão PEGA para investigar o uso do Pegasus e outros spywares na Europa.
Em novembro de 2021, o governo dos EUA colocou o NSO Group em sua Lista de Entidades por “conduzir atividades contrárias à segurança nacional ou aos interesses da política externa”. Nesse mesmo mês, a Apple entrou com uma ação contra o NSO Group para buscar responsabilidade por vigilância e ataques a usuários da Apple.
Nas últimas semanas, surgiram informações que a L3Harris, uma empresa contratante de defesa dos EUA, está negociando para adquirir a propriedade do software Pegasus. O futuro do NSO Group permanece incerto. “Qualquer movimento do NSO Group para mudar seu modelo de negócios para evitar a responsabilidade deve ser combatido. Toda a indústria de vigilância foi prejudicada e precisa urgentemente de reforma”, diz Danna Ingleton, diz Danna Ingleton. “Continuamos pedindo uma suspensão mundial da venda, transferência e uso de spyware até que medidas dos direitos humanos sejam implementadas para regular seu uso”.
De acordo com o direito internacional, os Estados têm a obrigação vinculante não apenas de respeitar os direitos humanos, mas também de protegê-los de abusos por parte de terceiros, incluindo empresas privadas.