Departamentos policiais de várias partes dos EUA não têm preservado o direito fundamental da população à liberdade de reunião pacífica. Ao longo das semanas, estes deixaram de proteger os protestos realizados contra a perturbação violenta cometida por grupos armados, entre outras manifestações, disse a Anistia Internacional hoje no relatório, que acaba de ser publicado, Losing the Peace: US Police Failures to Protect Protesters from Violence (Perdendo a paz: polícia dos EUA deixa de proteger manifestantes contra violência).

Desde o assassinato de George Floyd pela polícia, em maio de 2020, houve milhares de protestos pacíficos contra o racismo e com críticas a políticos em toda parte dos EUA. No entanto, em quase 200 incidentes de violência entre participantes de grupos conflitantes, a Anistia Internacional constatou que as forças policiais americanas frequentemente deixaram de tomar medidas preventivas para evitar a perturbação de reuniões pacíficas e se abstiveram de proteger manifestantes contra estes ataques violentos.

“Em meio ao aumento inusitado da volatilidade política e da violência, o governo americano e as autoridades policiais de todos os níveis precisam proteger com afinco os direitos à liberdade de reunião pacífica e de expressão”, disse Erika Guevara-Rosas, diretora para as Américas da Anistia Internacional. “No contexto de eleições fortemente disputadas e de um movimento nacional pelos direitos civis, ninguém deveria temer por sua vida quando tenta votar ou fazer-se ouvir em assembleias pacíficas”.

Entre maio e setembro de 2020 a Anistia Internacional documentou e confirmou enfrentamentos violentos entre protestos e contraprotestos em aproximadamente 75% de todos os Estados americanos. Em cerca de metade destes, a organização confirmou casos em que as forças policiais deixaram de proteger participantes de confrontos violentos com grupos contrários. Os órgãos policiais se abstiveram em muitos casos, em especial, de:

  • Alocar policiais apropriadamente treinados em número suficiente para impedir a potencial violência entre manifestantes de diferentes grupos;
  • Separar manifestantes rivais e desfazer tensões, quando isso era necessário para evitar enfrentamentos violentos;
  • Proibir e prevenir ameaças de violência por parte de grupos e indivíduos armados em assembleias pacíficas.
  • Suprimir atos de violência, intervindo em disputas entre manifestantes de grupos contrários e
  • Diferenciar atores violentos de não-violentos na reação policial a incidentes de violência, incluindo evitar dispersar assembleias quando elas se mantiveram pacíficas.

“Quando o presidente Donald Trump convoca seus apoiadores a ‘ir’ aos locais de voto e ‘vigiá-los’, e quando recomenda a grupos armados supremacistas brancos que fiquem ‘de prontidão’ durante as eleições, as autoridades policiais deveriam se manter em alerta máximo para prevenir a violência política neste momento explosivo”, disse Brian Griffey, pesquisador regional e consultor para a América do Norte na Anistia Internacional. “As autoridades governamentais e as forças policiais que elas dirigem precisam adotar novas políticas, estratégias e táticas para facilitar e proteger protestos pacíficos e para impedir que sejam tumultuados por grupos armados e outros atores violentos”.

Entre os incidentes documentados pela Anistia Internacional, mais de uma dúzia de protestos explodiram em violência, com a polícia quase inteiramente ou inteiramente ausente. Um elemento catalisador frequente dos confrontos violentos entre manifestantes de grupos contrários era a presença de homens armados. O discurso, as políticas e as práticas da administração de Donald Trump parecem encorajar a prevalência de grupos armados que ilegalmente agridem manifestantes pelo país afora.

Em um exemplo, um organizador de um protesto contra o racismo, Tony Crawford, disse à Anistia Internacional que “pessoas poderiam ter sido mortas” durante um enfrentamento violento entre sua comunidade e um grupo armado numa manifestação para pedir a remoção de uma estátua de um líder confederado da guerra civil americana, em Weatherford, Texas, em julho.

Em uma série de mensagens de texto ao chefe de polícia de Weatherford, às quais a Anistia Internacional teve acesso, Crawford escreveu: “Os patriotas [membros do grupo armado] estão nos cercando para forçar um confronto. Estamos cercados por armas e pessoas falando em voz alta sobre atirar contra nós. … Cadê a polícia, Chefe? Isto é um absurdo. Estamos sendo agredidos. Cadê vocês todos? Vocês nos abandonaram, chefe. Vocês nos deixaram ser arrastados e atacados enquanto vocês não fizeram nada”.

O governo dos Estados Unidos e as autoridades policiais americanas em todos os níveis precisam reformar as políticas e práticas de suas forças policiais para melhor facilitar a liberdade de reunião pacífica e para proteger manifestantes contra ameaças amplas de violência evitável. Na ausência marcante de proteção federal, os governos em nível local devem proteger protestos contra violência, emitindo ordens executivas temporárias para restringir a presença de armas em locais públicos, parques, estações de voto e em assembleias pacíficas, e instruindo seus órgãos policiais a impedir indivíduos e grupos armados de perturbar manifestações e atividades cívicas durante o período das eleições.

As forças policiais em nível das cidades, condados, Estados e federal devem imediatamente reformar sua conduta e implementar treinamentos especializados sobre a facilitação e proteção, em conformidade com os direitos humanos, da liberdade de reunião pacífica, de acordo com suas obrigações sob a Constituição dos EUA e com as boas práticas no policiamento de assembleias.

 

Antecedentes e contexto

 Em 4 de agosto, a Anistia Internacional publicou o relatório The World is Watching: Mass Violations by US police of Black Lives Matter protesters’ rights. (O mundo está observando: violações maciças dos direitos de manifestantes do movimento Black Lives Matter pela polícia americana).

Em 6 de outubro, a organização pediu aos governadores estaduais americanos para emitirem ordens executivas proibindo atores não estatais de portar armas de fogo em locais de voto ou nas proximidades desses locais durante as eleições gerais de 2020. Seis Estados já proíbem a presença de armas em locais de voto: Arizona, Califórnia, Flórida, Georgia, Louisiana e Texas.

Em 20 de outubro a Anistia Internacional também emitiu uma carta conjunta com a  Human Rights Watch e a Physicians for Human Rights, pedindo que governos municipais dos EUA adotem medidas especiais temporárias para evitar que indivíduos ou grupos armados intimidem ou ameacem manifestantes ou eleitores durante e após as eleições.

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