Ontem (02/07), cerca de cinco mil pessoas participaram do ato ecumênico realizado no Complexo da Maré em homenagem aos dez mortos durante operação do Batalhão de Operações Especiais (Bope), na noite do dia último dia 25 – entre eles um sargento do Bope. Moradores das comunidades do complexo e de outras áreas do Rio de Janeiro, advogados, jornalistas, artistas e instituições de dentro e de fora da Maré participaram do evento, pedindo o fim da violência nas favelas.

“A ação do Estado na última semana mostra que as instituições não assimilaram uma concepção de segurança pública voltada para paz. As últimas ações na Maré são o retrato de um sistema que ainda é dominante não só no Rio, mas no Brasil. Um sistema de segurança feito para a guerra. Essa lógica precisa mudar. É preciso reconhecer a necessidade de uma reforma na segurança pública, para que seja orientada para a democracia e não para a ditadura”, destacou Atila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional Brasil.

A manifestação exigiu ainda um pedido de desculpas do governador Sérgio Cabral e do Secretário de Segurança José Mariano Beltrame. Outra reivindicação é a suspensão imediata de qualquer operação policial que coloque em risco a vida dos moradores e dos agentes do Estado.

A maioria das lideranças das 16 comunidades que compõe o Complexo da Maré também participou do ato e demonstrou insatisfação com as operações policiais ali realizadas. Eles relembraram outras operações violentas que ocorreram ao longo dos anos, resultando em muitos mortos, feridos e em casas invadidas. “O Estado só entra aqui nas cores da polícia”, afirmou Rubens Vaz, da Associação de Moradores da comunidade de Rubens Vaz.

A presidente da Associação de Moradores da Nova Holanda, Andrea Matos, ficou emocionada ao citar a operação. “Chorei pelo desespero das famílias. Não pode haver truculência, sentimos na pele essa ação do Estado. Não dá para aceitar o secretário de segurança falar em rede nacional que a polícia fez o certo, e se for necessário fará o mesmo de novo. Essa não foi uma operação e sim uma chacina”, afirmou Andrea, defendendo que a polícia use mais recursos de inteligência em suas operações.

Diretora da Redes de Desenvolvimento da Maré, organização não governamental que atua no complexo, Eliana Sousa reivindicou o encerramento de um histórico de mortes. “Queremos um basta na violência. Não desejamos essa polícia”, destacou.

Muitas crianças participaram do evento, que correu de forma pacífica e sem incidentes. Em seus cartazes, mensagens que mostram o impacto das operações policiais na vida da comunidade:

“Não quero bala de borracha, taca halls !!!”

“Eu protesto por matarem meu avô. Por ameaçarem meu tio. Por matarem minha tia”. Cartaz do aluno da oficina de Arte sobre Azulejo, realizada pela Redes da Maré.

Para o especialista em segurança pública, Luiz Eduardo Soares, a sociedade já naturalizou a violência policial. “Há uma tolerância extraordinária na sociedade brasileira em relação à brutalidade policial letal, à brutalidade do Estado”, afirmou. Durante o ato, houve uma perfomance de artistas locais, representando os mortos da operação, que inclui um sargento do Bope.

Representantes da Ordem dos Advogados do Brasil participaram do ato para assegurar aos participantes o direito constitucional de manifestação. A Polícia Militar também esteve presente, garantindo que tudo ocorresse de forma pacífica.

“O ato na Maré acontece em um momento importante para o país, quando a população está em peso nas ruas por agendas diversas ligadas à expansão dos direitos. É a hora de virar esta página na história das favelas do Rio de Janeiro e do Brasil, exigindo uma política de segurança pública com total respeito aos direitos humanos de todos e todas, independente do local onde vivem”, finalizou Atila Roque.