As ações violentas e repressivas das Forças de Segurança colombianas, especialmente do Esquadrão Móvel Antimotim (ESMAD),  deixaram centenas de vítimas de traumas oculares no país, afirmam a Anistia Internacional, a ONG Temblores e o Programa de Ação pela Igualdade e Inclusão Social (PAIIS) da Universidade dos Andes em um novo relatório publicado  no dia 26 de novembro.

O documento “Colômbia: Tiros à vista: traumas oculares no âmbito da Greve Nacional” documenta 12 casos de violência policial que resultaram em traumas oculares irreversíveis. Quatro desses casos ocorreram em anos anteriores e oito ocorreram no âmbito da Greve Nacional de 2021, nas cidades de Bogotá, Popayán, Florencia, Medellín e Manizales. O Laboratório de Verificação Digital da Anistia Internacional analisou mais de 300 peças audiovisuais sobre as ações desproporcionais e repressivas da ESMAD de 28 de abril a 20 de outubro, concluindo que seus agentes geralmente violavam os direitos humanos dos manifestantes ao infringir lesões oculares em consequência do uso desproporcional de armas menos letais.

“É assustador ver como os agentes do Esquadrão Móvel Anti-Distúrbios atiraram deliberadamente nos olhos de tantas pessoas, apenas por ousarem exercer seu legítimo direito de manifestação pacífica. As autoridades colombianas devem garantir justiça, atendimento integral e reparação às vítimas e tomar as medidas necessárias para evitar a repetição dessas graves violações de direitos humanos”, disse Erika Guevara Rosas, diretora da Anistia Internacional para as Américas.

O relatório dá visibilidade às histórias de vítimas de traumas oculares e descreve as múltiplas barreiras enfrentadas para garantir atendimento especializado em saúde e psicossocial. Para várias vítimas, as barreiras ao acesso a um trabalho decente ou à continuação de seus processos educacionais em condições de igualdade aumentaram.

As histórias descrevem em detalhes que os ferimentos não foram “incidentes”, mas ataques direcionados com a intenção de punir os/as manifestantes pelo exercício legítimo de seu direito ao protesto social. E, mais uma vez, revelam padrões de conduta dos agentes da ESMAD que sustentam repetidas denúncias sobre a natureza sistemática de suas práticas de uso excessivo e desproporcional da força.

“As autoridades colombianas devem garantir justiça, atenção integral e reparação às vítimas e tomar as medidas necessárias para evitar a repetição dessas graves violações de direitos humanos.” Erika Guevara Rosas, Diretora para as Américas da Anistia Internacional

“A violência policial não pode continuar fazendo parte do nosso dia a dia. Não podemos nos acostumar com o Estado indiscriminadamente violento contra os cidadãos, muito menos ferir aqueles que exercem seu direito de protestar. Os casos de violência policial e, especificamente, de lesões oculares cometidas no âmbito da greve de 2021 registrados em nossa plataforma, mostram que as ações das forças policiais não cumprem os padrões internacionais de direitos humanos e que uma reforma policial é necessária para garantir a integridade e a vida das pessoas”, disse Alejandro Rodríguez, coordenador do Grita, um Observatório da Violência Policial da Temblores.

Um dos casos mais emblemáticos do relatório é o de Leidy Cadena, uma estudante de ciências políticas que se manifestava pacificamente com seu namorado e alguns amigos no centro de Bogotá em 28 de abril quando agentes da ESMAD os abordaram agressivamente. “Eu apenas gritei ‘vamos lá’ e imediatamente meu rosto ficou super quente. Não conseguia ver com nenhum dos meus olhos, fiquei desesperada”, disse Leidy.

A Anistia Internacional verificou um vídeo após os eventos, em que cinco agentes da ESMAD são vistos com escudos e dois deles carregam seu equipamento anti-motim nas mãos, com armas mecânicas. Leidy cobre seus olhos que sangram, claramente com dor e seus companheiros pedem ajuda, mas os agentes da ESMAD não a ajudam.

Leidy perdeu um olho no ataque. Ela considera que foi um ato de violência de gênero, pois os demais saíram ilesos e desde o início das manifestações ela notou diversos ataques contra mulheres. Após relatar os fatos à Procuradoria-Geral da República, Leidy garante que teve que relatar o que aconteceu em pelo menos 10 entrevistas e que isso a fez reviver o trauma. Além disso, recebeu ameaças nas redes sociais e no dia 16 de outubro foi vítima de um ataque de pólvora sob sua porta. Ela, sua mãe e seu companheiro foram forçados a viajar para fora da Colômbia devido às ameaças.

“Não podemos nos acostumar com o fato de que o Estado viola os cidadãos de forma discriminatória, muito menos fere aqueles que exercem seu direito de protestar.” Alejandro Rodríguez, Coordenador do Observatório da Violência Policial de Temblores

Com base nas evidências e testemunhos apresentados no relatório, a Anistia Internacional e outras organizações contra a Violência Policial, incitam as autoridades colombianas a cumprirem sem demora as recomendações feitas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos após a sua visita de trabalho ao país em junho de 2021 – em particular a adotar a utilização de meios não letais de controle da ordem pública sob um rigoroso protocolo público.

Para prevenir o uso excessivo da força durante os protestos, as autoridades colombianas devem reformar estruturalmente a Polícia Nacional e em particular a ESMAD, garantindo uma abordagem civil em suas ações, bem como sistemas de supervisão independentes e eficazes e protocolos de investigação para investigar os abusos policiais. Da mesma forma, devem criar rotas de acompanhamento para as vítimas de lesões oculares e violência de gênero que incluam prevenção, tratamento, reabilitação e atenção psicossocial.

“Tivemos a honra de acompanhar várias vítimas de lesões oculares para prestar depoimento sobre seus casos perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e ainda acompanhamos legalmente algumas delas. Compreendemos sua luta e frustração e apoiamos suas reivindicações por justiça. Estamos convictos da necessidade de continuar a tornar visíveis as formas como a força pública não só não garantem os direitos dos cidadãos, como os viola deliberadamente. As lesões oculares são apresentadas como uma punição para as vítimas por exercerem seu legítimo direito de protesto, que está impresso em seus rostos e em suas vidas”, disse Juliana Bustamante, diretora do PAIIS.

 

Para obter mais informações ou para marcar uma entrevista, entre em contato com Duncan Tucker: [email protected]

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