Após mais de 160 horas de júri, com divisão em três fases, entre 20 de junho e 16 de setembro, encerrou-se, na madrugada de ontem (16), o julgamento de 20 dos 34 policiais militares acusados de participação na Chacina do Curió, CE. Ao todo, foram seis condenações e 14 absolvições. Outros 10 policiais aguardam recursos em instâncias superiores e ainda devem ser julgados, e três tiveram condenações desclassificadas para Vara de Auditoria Militar.
Na última sessão, iniciada em 12 de setembro, dois policiais militares foram condenados, um dos agentes por dois episódios de tortura física e um de tortura mental; e o outro por múltiplos crimes – entre eles, 11 homicídios e três episódios de tortura física e um de tortura mental. Além disso, seis agentes, acusados por omissão na ocasião dos crimes, foram absolvidos, tendo um deles tendo a acusação encaminhada para a Vara de Auditoria Militar.
A Anistia Internacional Brasil esteve ao lado dos sobreviventes, mães e familiares das vítimas da chacina ao longo desses oito anos de luta por justiça e assim permanecerá. Reiteramos que os resultados desse júri, embora apontem avanços no sentido da quebra do ciclo de completa impunidade diante dos crimes, não encerram os deveres do estado do Ceará em garantir verdade, justiça e reparação às famílias.
A Anistia Internacional Brasil reforça sua profunda solidariedade para com os familiares das vítimas e sobreviventes e insta o Governo do Estado do Ceará a adotar medidas efetivas e céleres, em consulta com as pessoas afetadas, para garantir proteção, cuidados em saúde física e psicológica e reparação. Instamos ainda o atual governo a avançar na adoção de medidas contundentes de reorientação de sua política de segurança pública, garantindo um padrão de policiamento condizente com a defesa dos direitos humanos, a começar pelo direito à vida. Para que chacinas como a do Curió nunca mais se repitam!
A madrugada de terror que resultou na chacina do Curió não é um caso isolado no CE. Apenas em 2023, 85 pessoas já foram mortas por intervenção policial no estado. O caso também é representativo do descontrole das forças policiais no país, que tem resultado em um padrão de política de segurança pública baseado no confronto e na criminalização da pobreza, resultando em um policiamento caracterizado pelo uso desnecessário e excessivo da força, execuções extrajudiciais, invasões, torturas e outras graves violações de direitos que afetam de forma desproporcional adolescentes e jovens negros, moradores de favelas e periferias.
Atualmente, no Brasil, uma média de 17 pessoas são mortas diariamente por intervenção policial. A recorrência com que a Anistia Internacional Brasil denuncia tais abusos é reveladora da falha dos governos federal e estadual e do Ministério Públicos em estabelecer a supervisão efetiva das forças de segurança pública, além de mecanismos de responsabilização por esses crimes.